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Minna 2 - O outro



Nem meu irmão mais novo quis me levar como motorista pro rolê dele. Eu juro que tentei de tudo pra sair de casa hoje. Mas meu quarto, simplesmente, me puxava de volta. Fui lá embaixo, assisti um pouco de novela com minha mãe, depois fiquei observando ela e meu pai tentando decidir o que assistir no Netflix, e acabarem chegando a uma conclusão que não agradava nenhum dos dois. Tentei acertar a bola na cesta de basquete da garagem, zero sucesso. Abri a geladeira diversas vezes. E de forma alguma o tédio parecia querer ir embora. Então eu me rendi. Fiquei jogada na cama, no escuro, olhando pro meu teto brilhoso. Eu e meus pais tínhamos colado aquelas estrelas quando eu tinha uns doze anos e até hoje elas insistiam em continuar por ali.

Não só as estrelas de plástico. Tinha mais coisas na minha vida que não queriam ir embora de jeito nenhum. Uma pessoa, em específico. Se eu queria terminar e não era mais capaz de aturar o rosto dele na minha frente, porque diabos eu não conseguia fazer isso? Ao invés de agir com maturidade eu simplesmente passei a ignorá-lo. E mesmo assim ele continuava a me entitular sua namorada. Qual é o problema das pessoas que faz com que elas não consigam forças suficientes para sair de uma situação que as deixa mal?


Um som similar a um apito de trem começou a sair do meu celular eu me assustei com a música repentina. “Diego chamando”.

- EEEI Dii- Eu quase gritei. Fazia uns dois dias que eu não recebia um sinal sequer de vida daquele menino. - Por onde você andou ?

-Você não vai acreditar, Mi. Eu consegui entrar para a Federal do Paraná. Eu vou pra fucking Curitiba. - Eu conseguia vê-lo sorrindo em quanto dizia isso.

Levei uma mão a boca, superpresa. Ir para Curitiba era seu maior sonho.

-Ai meu DEEEUS, PARABÉNS! Quando você vai ?

- Amanhã.

-O QUE ?! E você só me diz isso agora, seu puto ?

Curitiba ficava praticamente do outro lado do país. Eu só voltaria a vê-lo nas férias de meio de ano, provavelmente. Diego era uma das poucas pessoas que eu queria ter por perto no momento.

-Eu sei mulher, foi tudo muito corrido. Você ainda é a primeira a saber. - Ele fez uma pausa. Ele tá chorando ? Espera aí. A gente não chora. - Eu vou hoje na reunião da sala- ele voltou a falar – Vamo comigo.

-Aah, não, você sabe que pode me pedir qualquer coisa. As meninas vão estar lá, o Marcos vai estár lá. Nem pensar.- Resmunguei.

-Marcos ? Seu namorado Marcos, você quer dizer? - Ele se fez de sínico. - O que tá acontecendo Mi?

- Faz quatro dias que eu venho ignorando ele.

-Nossa, Mi, como você é adulta- Ouvi ele batendo palmas do outro lado.- Levanta dessa cama garota. Eu tô passando aí em vinte minutos.


- Que mendiga. - Foi a primeira coisa que meu melhor amigo soltou quando me viu.

-Obrigada.- Eu sorri e fiz um movimento de bailarina com a saia.

Ele se jogou pra cima de mim e me deu um abraço demorado, que eu suspeitava, era mais do que só um abraço, era uma despedida.

Diego e eu nos conhecemos na sétima série. Foi bem na época que uns caras muito escrotos começaram a espalhar pela escola que ele era gay. Não existe problema nenhum em ser homossexual. Existe problema em ser um babaca e achar que esse é um bom tema para piadas. Diego nunca se assumiu, mas também, nunca chegou a dizer que não era. Apenas ficou queito. Ficamos quietos. Nunca conversamos sobre o assunto. E ele foi eliminado dos grupos dos meninos. Eu sabia que ele queria ir naquela reunião da sala só para esfregar a faculdade e o curso dele na cara de todo mundo. E eu apoiava esta decisão.


- Que história é essa de que você tem outro? - Ele perguntou assim que desfizemos o abraço.

-QUE?!

-Tão falando por aí. Que você tá traíndo o Marcos e por isso você sumiu.

-Quanta bobagem. É claro que não. Eu sumi simplesmente porque não sou mais obrigada a aturar ninguém.

- Eu te deixo por dois dias e você se transforma numa total RBD. Pode me explicar em detalhes, e pausadamente, o que está acontecendo ?

Soltei um suspiro de rendição. Eu sabia que em algum momento ia ter que falar sobre tudo pra ele. Então eu deixei que ele jogasse o braço por cima dos meus ombros e me guiasse pela rua. Nossos skates de baixo dos braços livres.

Estereótipos foi a maior lição de vida que o Diego deixou pra mim. A gente andava de skate, mas não éramos esportistas; ficávamos entre os rockeiros mas não éramos um deles; achavam que ele era gay e que eu traía meu namorado. Nós éramos duas peças que não se encaixavam, de forma alguma, naquele quebra cabeça do ensino médio. Mas isso nunca quis dizer que não acharíamos o jogo ao qual pertencemos.

Ficar sem ele por perto seria uma morte bem lenta para mim. Eu sabia que as coisas mudariam dali pra frente. Eu sabia que ele não estava deixando apenas a cidade e todas pessoas que zombaram dele. Ele também estava me deixando pra trás. Não de um modo ruim. Mas tudo o que nós passamos, todos os anos de amizade, se tornariam histórias. Isso tudo só não está sendo tão pior pelo fato de que essa amizade que a gente tem que em alguns dias viraria história, é uma história incrível.

*Esse texto é um dos capítulos das história "A fantástica jornada de Minna e Danilo", que você também pode encontrar pelo nome de História 2.

TOP 3 QUALQUER COISA

#1 

How I met your mother SIM, porque faz a gente pensar na vida.

 

#2

Alessia Cara. Porque Seventeen me fez começar este blog.

 

#3

Natal. Porque é a melhor época do ano.

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